Tenho visto tantos comentários - positivos e negativos -, e até "crise de abstinência", devido ao término da novela Verdades Secretas, que senti vontade de me mexer na cadeira e escrever minha simples opinião sobre o emblemático último capítulo da obra.
Não, não me perguntem sobre Fanny ter terminado numa boa, sem pagar pelo crime de levar adolescentes a fazer "book rosa", arrumando até mesmo um novo garotão a quem pudesse dominar através do dinheiro; Anthony e Giovanna terem ido, dentro de um triângulo amoroso, para Paris, com a frieza e o egocentrismo típicos; sobre o próprio "book rosa", se acabou ou não; Larissa ter se libertado das drogas; sobre Visky e Lourdeca só ficarem juntos quando estão bêbados; Pia, por largar seu apego à riqueza e aceitar uma vida menos exuberante ao lado de seu "namorido" Igor; até mesmo o fato mal explicado que uma arma de um crime fatal não tenha sido retida pela polícia e volte para a mesma casa onde ocorreu a tal fatalidade.
Nada disso. Meu papo reto vai ser sobre o amor, esse "sujeito" tão rarefeito no perfil da maioria dos personagens desta ficção.
O amor é estranho, bem estranho, e tem um caminho muitas vezes torto para fazer valer. É o maior dos sentimentos que um ser humano pode ter, e é tão perfeito, que o axioma de nossa existência é exatamente esse: só é considerada PESSOA aquela que verdadeiramente ama alguém ou algo.
Angel era uma pessoa, no sentido real da palavra: ela amava!
Para entendermos o sentimento da moça, é necessário se fazer um pequeno retrospecto de sua trajetória como garota humilde do interior, até sua consagração como modelo.
Carolina, a mãe de Arlete (Angel era o seu nome artístico, todo mundo lembra disso) fora traída pelo marido, que tinha uma nova esposa e filha, a pequena Yasmim.
A ainda adolescente de 16 anos, Angel, sempre quis ser modelo, e a sua oportunidade chegou, quando ela e a mãe se mudaram para a casa da avó na capital de São Paulo. Foi agenciada por Fanny e imediatamente chamou a atenção por sua beleza e carisma.
A avó passava por problemas financeiros. Logo Angel aceitou algo que tanto recusava, que era o famigerado "book rosa", aquele onde modelos aceitam fazer programas com clientes que pagam pequenas fortunas.
Quitou a dívida da avó. E aconteceu o imprevisto: apaixonou-se pelo seu cliente, o Alex.
O empresário Alexandre Ticiano, mais conhecido por Alex, rico, despótico, egoísta e um pedófilo, trazia em sua personalidade um gosto por modelos bem jovens, ao ponto de considerar mulheres de 26 anos, por exemplo, como "velhas".
Por algum motivo ficou obcecado pela garota interiorana e a recíproca era verdadeira!
Não demorou muito, e a avó descobriu que a neta fazia programas. Enviou a garota, imediatamente, para a casa do pai no interior do estado, sem que a filha Carolina soubesse o motivo genuíno.
Lá ela conheceu a nova mulher do pai e a sua irmãzinha Yasmim, um doce de criança que até uma flor lhe ofereceu, quando Letinha - Angel -, entrou em seu quarto.
Muitos percalços passou a adolescente. Já tinha namorado Guilherme, mas nunca sentira amor por ele (seu carinho era mais por ter sido o rapaz, o primeiro homem de sua vida). Não pôde mais exercer a profissão de modelo, condição imposta pela avó para não se envolver novamente em "romances pagos".
Voltou para casa.
Algum tempo depois, estava nas passarelas novamente, e novamente envolvida com Alex.
Uma acusação de estupro de uma colega de profissão, porém, a afastara do cara que tanto a atraía.
Alex armou um casamento com Carolina, só para ficar mais perto da moça.
E conseguiu. Afastada a suspeita de estupro, Angel largou-se nos braços daquele sujeito que a envolvia como ninguém conseguia, a despeito de correr um risco grande de magoar a própria mãe, se um dia os flagrasse juntos. Esse é o caso que podemos chamar de traição dupla, tanto da moça quanto do marido, sendo que a primeira era ainda mais dolorosa.
É claro que esse dia teria que acontecer, mais cedo ou mais tarde.
Carolina, que sabia atirar muito bem, ameaçou matar Alex, ao ver o casal na cama. Angel se jogou na frente dele para que a mãe não o fizesse, alegando que o amava.
Ao descer as escadas, na cozinha, Carolina deixou uma carta-despedida para Letinha, dizendo que fosse feliz e que amava muito a filha. Matou-se após escrever a tal carta.
Angel sofreu muito; Alex, nem um pouco
Para a casa no interior que a moça retornou, foi morar com o pai, sendo procurada pelos dois homens que tanto a cortejavam: Guilherme, e depois, Alex.
Naturalmente que a presença de Alex que mais a interessava, fosse qual fosse o motivo.
E é aqui que vem a maior demonstração de amor da modelo - na minha simples opinião, ressalto outra vez - quando, num passeio de lancha, Angel descarrega seis ou sete tiros no homem que ela protegeu das balas que a sua mãe teria desferido.
"Como assim? Não é coisa de maluco matar logo alguém que se protegeu da morte? E quem ama, não mata...", alguém pode dizer.
"Mas ela matou Alex por arrependimento já que a sua mãe se suicidou por causa do casinho dos dois... Ela matou por amor à mãe!", outro diria em resposta.
"Angel é sociopata! Todo o tempo ela só pensava nela, nunca teve amor a ninguém e ainda mataria mais gente...", uma das referências que mais leio sobre a adolescente.
Ela amava, sim. Mas não foi por amor à mãe, muito menos por Alex, que a garota lançou tantos tiros no amante.
A modelo, que tinha sonhos comuns, como ter dinheiro, ser famosa e casar, coisa que a maioria de nós possui, trazia no seu coração um amor tão lindo e sublime que muitos de nós, infelizmente, não sente: o amor pela sua irmã Yasmim.
Foi por amor fraternal que Angel matou Alex!
A moça não era o tipo da mana grudenta, que visitasse a garotinha, mas ela sempre amou a menina, do jeito dela. Quando a conheceu, disse-lhe que a pequenina era linda e as duas formaram um laço de imediato. Nos poucos momentos juntas, víamos uma Angel dedicada, sorridente, condescendente, oferecendo pão e leite no café-da-manhã (conferimos isso no último capítulo), na típica preocupação da irmã mais velha.
Por mais incrível que possa parecer, Angel não amava a ninguém, nem mesmo sua mãe, avó e o próprio Alex. Apenas gostava; não era amor.
Percebemos que não se tratava do sentimento nobre o que sentia pela mãe, devido ao quase nada de arrependimento por traí-la debaixo do mesmo teto onde viviam; não amava a avó também. Mesmo sabendo de sua doença, não permaneceu ao seu lado até a sua morte. Um pouco mais perto de amor sentia por Alex, mas era mais atração física do que qualquer outra coisa porque, em momento algum, fizera grandes sacrifícios para tê-lo.
Quando Guilherme a pedira em casamento, Angel disse que resolveria umas coisas antes. Se o aceitasse, seria para sempre.
As tais "coisas" na ordem do dia para ela, era esperar Alex procurá-la. Se ele fosse, veria o que faria (sim, planejava vingar o suicídio da mãe, mas não seria propriamente matando o amante) ou talvez, simplesmente, ficasse com ele.
Havia um semblante de prazer terno, não perverso, no momento que ele a visitara, finalmente, na casa do pai. Ficou sorrindo labialmente, como uma menina contente que receberá algum brinquedo. Manteve essa postura encantada, enquanto o ouvia dizendo que a levaria e pagaria os seus estudos, assim sendo, dando continuidade a sua educação, como a mãe dela tanto queria.
Sua fisionomia mudou radicalmente, ficou séria, no entanto, na menção que Alex fizera de que também cuidaria da pequena Yasmim e lhe daria a mesma educação que propusera à Angel.
Angel sabia que tipo de "educação" que o empresário lhe proporcionaria com o tempo: muitas joias, muito dinheiro, uma vida de luxo, desde que a garotinha tivesse sexo com ele.
Vejamos: Alex não gostava de "velhas". Quando Angel estivesse com seus vinte e dois ou vinte e três anos, ele a deixaria. Yasmim, nessa época, estaria com uns quatorze ou quinze, já no "ponto" que ele tanto gostava.
O autor Walcyr Carrasco, inteligentemente, não deixou a modelo chegar à idade adulta. Terminou a novela, tendo ela dezessete anos. Era ainda objeto de gosto de Alex. Mas... Até quando seria?
Repito: por amor à irmãzinha, Angel matou Alex.
Ela não queria que a menina seguisse pelo mesmo caminho. No fundo, a modelo jamais aceitou o fato do seu amante só querê-la pela pouca idade e beleza. Não era tão ingênua assim ao ponto de desconhecer que esse tipo de atitude por parte dele é crime. O modo estranho que arquitetou de evitar que isso acontecesse à garotinha, seria eliminando aquele pervertido.
A vida de Alex até seria poupada, se ele não propusesse a "educação" para Yasmim. Foi exatamente naquele momento que a modelo decidiu o que faria com o empresário.
Numa lancha de nome bem sugestivo - Gênesis - Angel recomeçaria a sua vida.
No casamento com Guilherme, seu ar enigmático talvez quisesse dizer que o dinheiro não compra tudo, que o amor de verdade por algum ser é ainda o que vale a pena, coisa que Alex jamais entenderia.
Ao afirmar com a já esposa Angel que a faria feliz, Guilherme ouviu dela a seguinte resposta: "Eu já sou feliz, muito feliz!"
Naturalmente uma referência ao bilhete que a mãe deixara, que a induzia a esse estado de vida, de felicidade, algo que todo mundo almeja ter.
Ela estava mesmo em plenitude porque tinha conseguido proteger o seu amor.
A pequena Yasmim não passaria pelo o que ela passou pois agora Angel poderia lhe dar educação de verdade, proteção, dinheiro para fazer o que quisesse e teriam laços fraternais enquanto vivessem.
Mesmo que de maneira esquisita, enviesada, Verdades Secretas foi uma história de amor.
Bem, pelo menos é a conclusão que mais vejo sentido...
(Imagem:
Fonte desconhecida)