PARA QUEM AMA GATOS

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quinta-feira, 7 de novembro de 2019

Carola


Conto de hoje: Carola.
Do livro de contos VIDA, VEZ... VOZ DE GATO, de Mary Difatto.
Toda quinta-feira, uma nova publicação.
A história de um gato contada por ele mesmo.


                             Carola


Eu já conhecia o meu futuro papai humano de muito tempo, desde que vim morar aqui.
Foi no térreo desse mesmo prédio que eu ficava, dormindo no estacionamento, recebendo comida e água de alguns moradores que tinham pena de mim.
Sou uma gata rajadinha de cinza e preto, com uma cauda cuja ponta é um pouco quebrada, mas é de nascença, não por causa de maus tratos. Tenho olhos verdes bem bonitos e graúdos.
Papai humano passava por mim quase todos os dias, no momento que estava na calçada para pegar um solzinho gostoso da manhã.
Mas ele nem me olhava... Parecia até que tinha raiva de mim!
Passava com a cadelinha dele para os passeios matutinos. 

Saíam com roupa esportiva. 
Era interessante ver a cadelinha com uma camisetinha e boné, toda posuda e língua de fora, uma das características dos cães.  Dava a impressão de que apreciava muito aquelas voltinhas no quarteirão.
Por incrível que pareça, aquela bichinha gostava de mim.
Abanava a cauda quando me via, soltava uns latidinhos amistosos, e não ameaçava correr atrás, caso eu me assustasse.
Meu futuro pai sabia de seu afeto. 
Tanto é que às vezes até evitava de passar perto de mim, para que a cadelinha não ficasse animada com a minha presença.
De algum modo, também gostava dela.
Era mansinha, engraçadinha e muito gentil. Bem diferente de outros cães chatos do prédio, que latiam só por eu existir!
Certa vez, meu pai ficou irritado com a cadelinha.
Tudo porque queria muito se aproximar de mim, se balançando toda na coleira, e o meu futuro papai, sem paciência, foi logo ralhando:
- Deixa o gato! Parece maluca, querendo brincar com esse bicho...
O tom de voz dele foi tão ofensivo!...
De "bicho", ele havia me chamado, como se eu não merecesse amor e carinho. Havia se esquecido que a sua cachorrinha também era bicho, mas ele não a ofendia...
Ficava reparando aqueles dois toda vez que os via. Ambos eram fascinantes para mim.
Papai faz o gênero fitness, está sempre malhando, tem uma saúde de ferro! E desde o princípio, logo quando o conheci, ele já era assim. 
Por causa do papai, a cadelinha também é bem corpulenta, muito bem tratada, come comida de atleta igual a ele.
De repente, no entanto, aquele lindo quadro que eu apreciava quase todos os dias, mudou.
Não via mais a dupla pela manhã, nem em outro horário. Simplesmente, a cadelinha havia sumido das minhas vistas!
Ele, eu ainda continuei vendo bem cedo e à noite, mas em ambos os horários, somente no estacionamento. Saía de carro, com ar responsável, todo engravatado.
Achei tudo tão estranho... O que será que havia acontecido?
Alguém um dia comentou com ele:
- 'Tá pegando cedo agora, né?
- É, e todos os dias! Não dizem que "O olhar do dono é que engorda o gado"? Estava deixando o meu escritório nas mãos dos outros... Quase que fui à falência!
- Verdade. Boa sorte com a empresa!
- Obrigado! Depois a gente conversa melhor!...
E saiu rapidamente, para não se atrasar.
Daí eu descobri que ele não tinha mais tempo para dar uns giros com a cadelinha... Estava se dedicando aos negócios.
Não demorou muito tempo para eu descobrir uma outra coisa.
Estava eu deitada na calçada de manhãzinha, quando avistei papai de longe, sem o carro, andando de roupa comum.
Ouvi a conversa dele com uma moça:
- Ela chora à beça quando eu saio. Joga as patas em cima de mim, morde de leve o meu braço, fica ganindo... Não quer que eu saia!
- A pobrezinha está deprimida. Fica sozinha o dia todo... Arruma um amiguinho pra ela!
- Mas, outro cão, não quero. Ela já me dá muito trabalho!
- Talvez um cachorro pequeno. Ela é de porte médio, mas o amiguinho pode ser menor. O que você acha?
- Vou pensar. Hoje estou de folga, posso dar umas voltas para animá-la. Mas... Nos outros dias?
- Pois é. Pensa bem naquilo que te falei. Tchau!
- Tchau!
Meu pai estava meio pensativo quando entrou. Não me viu, como sempre. Mas eu o observei com firmeza, até sumir pela portaria caminhando para o elevador.
Num certo dia, um outro de folga dele, finalmente me notou!
Seu olhar foi tão profundo, que cheguei a gelar. Eu não sabia de suas intenções.
Apanhou um pouquinho de ração de cachorro do pacote, e ficou me chamando. Fui ao seu encontro. 
Já no seu colo, quis fugir, não conseguindo, porque ele entrou rapidamente no elevador, me contendo com muita vitalidade para eu não feri-lo.
Quando consegui saltar, era tarde demais: estava dentro de seu apartamento.
Dali eu vi a cadelinha e me senti segura, por saber que ela era boazinha comigo.
Quando me avistou, correu ao meu encontro abanando a cauda, me lambendo toda. Eu que era carente de afeto de qualquer ser, aceitei o seu carinho com a maior alegria do mundo!
Assim ficamos amigas, amigas mesmo, de comermos juntas, dormirmos juntas e assistirmos TV juntas do papai, quando ele volta do trabalho.
A depressão dela teve fim, e nunca mais chorou quando papai saía e sai para qualquer lugar.
Nos primeiros dias quando cheguei ali, eu era só a companheirinha da minha amiga canina, e meu pai nem quis me dar um nome.
Mas vendo que fui de extrema recuperação para aquele ser que considerava como sua filha, passou a ter carinho por mim também.
Amor de verdade, aquele amor que faz com que os corações mais endurecidos se derretam aconteceu, porém, quando eu "amassei pãozinho" nos ombros dele.
Estava meu pai muito estressado, reclamando de dor, e uma coisa passou na minha cabeça, que talvez ele estivesse precisando de um relaxamento. 
Sem pestanejar, pulei em suas costas, apertei bem minhas patas (sem mostrar as unhas, claro), do modo mais carinhoso possível,  e só saí de lá, quando percebi que ele estava mais calmo, não reclamava. 
Quando se virou, seus olhos estavam um pouco marejados. 
Então, me pegou, encostou o seu rosto no meu, e eu aproximei meu nariz no dele. Selamos o parentesco naquele momento. E foi nesse dia que ganhei o nome Carola.
Somos uma família bonita e bem unida!
Papai posta fotos nossas nas redes sociais, e tenho roupinha esportiva também. 
Meu boné traz o nome Carola, com letras bem estilosas.
Sei que papai me ama muito, muito mesmo.
Ele tem algumas tatuagens muito maneiras, e a maioria são homenagens a vários seres que tem afeição.
A tatuagem da cadelinha está retratada em seu braço, uma linda estampa, mostrando a sua beleza e a boquinha aberta.
E uma grande surpresa eu tive quando, na semana passada, também ganhei a minha, pertinho da minha amiga canina, com meus olhos verdes grandões evidenciados.
Na legenda abaixo de nossas imagens, vem escrito: "Minhas filhas, amores eternos!"
Decididamente, eu tenho o melhor papai e maninha do mundo!...

(Imagem:
https://www.facebook.com/MaryDifattoOficial)

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